Venha comigo embarcar nessa viagem pelos bastidores, análises, curiosidades
e experiências da época com essa fabulosa trilogia de fantasia e ação.
Michael Ende (1929-1995), o autor original do livro, ficou decepcionado quanto aos rumos do filme original de 1984. As suas sequências seguem a mesma linha, sendo quase uma refilmagem do filme de 84 mas com emoções especiais aos fãs da história.
A História sem Fim I eu assisti pela primeira vez em sua exibição na Sessão das Dez que acontecia todo Domingo ao fim de Topa Tudo Por Dinheiro - do antigo TVS (TV Silvio Santos e hoje, SBT). Isso era meados de 1990 (e o filme é de 84 - sem dúvida um dos anos mais especiais da cultura pop).
Foi em 1991, quando o segundo filme chegava às locadoras, tive finalmente conhecimento de sua continuação. Meu pai então chegou de presente com uma porção de VHS. A relação entre pai e filho no filme espelhava muito bem a relação familiar que eu tive com o meu pai em casa - a afinidade e os desentendimentos. É afetuosa e carismática.
A História Sem Fim III é um filme para se assistir como uma criança assistiria. É uma visão anos 90 da história de Bastian. É uma grande surpresa do ano do Treta. Lançado em 1994 - 10 anos após o primeiro filme - o título chegou tímido nos cinemas. Mas eu me recordo muito bem de seu cartaz em preto e branco nas páginas de jornal: "A Aventura Continua" três anos após assistir A História Sem Fim I e II, aquele foi uma enorme surpresa.
Enquanto o segundo filme estreava nos cinemas, o primeiro filme era exibido e reprisado nas sessões do SBT durante as noites de Domingo.
POLÊMICA NOS BASTIDORES:
OS DESENTENDIMENTOS, LIVRO CONTRA ADAPTAÇÃO
O livro A História Sem Fim foi originalmente lançado na Alemanha em 1º de Setembro de 1979 (neste mesmo ano, surgia a produtora que cuidaria da versão cinematográfica).
Cogita-se que Michael Ende (autor do livro) recebeu apenas U$$ 5 milhões para liberação de adaptar sua história para os cinemas. Embora ele tenha sido consultado para revisar o roteiro, Ende não teria ficado satisfeito com a versão gravada e exigiu que seu nome fosse retirado dos créditos iniciais do filme de 84 e o título do longa alterado. Ao ter seu pedido negado, ele teria processado a produtora alegando que Petersen (diretor do filme) teria reescrito o roteiro e alterado a importância dos personagens fantásticos. Ende, no entanto, teria perdido o processo.
Nascido em 1929, Michael Ende, nasceu na Alemanha e era filho de um pintor surrealista que foi banido pelos nazistas em 1936. Aos 16 anos, desertou ao ser chamado para a guerra em 1945. Foi ator, crítico e finalmente escritor. Ende faleceu 1 ano após o terceiro filme.
A HISTÓRIA SEM FIM: A TRILOGIA
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QUANDO A FANTASIA TRANSCEDE A REALIDADE
TRILOGIA REDESCOBERTA
A TEORIA DO FILME ORIGINAL
A História sem Fim de 84 pode ser interpretado em duas condições: os acontecimentos podem se dividir entre fantasia e realidade ou, possivelmente, tudo uma fantasia de Bastian (Barret Oliver) ? Se Ende permitisse, teríamos uma refilmagem que poderia chegar a essa interpretação (o que seria um conceito bastante profundo), porém, o autor jamais permitiria. O longa se desenvolve até a metade do livro. O começo é aparentemente morno para audiências atuais mas prende pela trilha sonora de Limahl com arranjo do produtor Giorgio Moroder (lenda da música eletrônica). A Imperatriz é interpretada pela encantadora Tami Stronach (que tinha apenas 10 anos e teve de usar dentes postiços da frente devido a perda dos incisos).
Atreyu (Noah Hathaway) e Bastian (Oliver) são a mesma pessoa em universos diferentes (sendo Atreyu a versão aventureira de Bastian) se levar em consideração que fantasia e realidade estão separadas na imaginação do protagonista. Por isso, é Bastian (na forma de Atreyu) é quem aparece cavalgando sobre o Dragão da Sorte no icônico cartaz. Porém, a narração oculta ao fim do filme pode quebrar essa teoria.
QUANDO A FANTASIA TRANSCEDE A REALIDADE
O papel de Noah no filme é extremamente competente. É um elemento ultra raro no cinema: uma estrela mirim de ação. Num misto de ação e drama, Noah é um dos melhores personagens do filme defendendo o papel do grande guerreiro Atreyu.
G'mork, uma espécie de lobo e demônio, é extremamente assustador. Fora o desafio da esfinge o qual Atreyu precisa enfrentar (só de olhar aquelas estátuas, dava um frio na espinha). E em falar nisso, compartilhando uma experiência pessoal: eu lembro que, literalmente, sempre tive medo do escuro e o mesmo sempre aparecia em minhas imaginações férteis aquele lobo preto naqueles aqueles olhos vermelhos e avisando: "-Hoje à meia noite" com aquelas falas com som abafado de corredor como se ouvia nos antigos anúncios da TV Globo e aquela musiquinha de encerramento da emissora.
O FIM DE TUDO QUE EXISTE
Bastian e a Imperatriz: o fim de tudo.
Embora A História sem Fim seja considerado uma história para crianças, o filme de 84 deixa um elemento bastante expressivo e que nunca envelhece. Reunindo inspirações da cultura oriental (o Dragão da Sorte é um belo exemplo disso), temos o apocalipse como um vilão personificado na forma do "Nada". É a destruição de tudo o que existe, e isso é muito bíblico. O protagonista é um sonhador e é a peça importante para salvar Fantasia (o mundo em que vivem as criaturas imaginárias). Em tempos de guerra e assuntos tão críticos, nos envoltamos em esperança e no belo mundo da imaginação para nos refugiarmos (não é à toa a overdose de filmes de super-heróis e o qual eles fazem tanto sucesso: o desejo otimista da humanidade).
A História Sem Fim, definitivamente, não é história para criança dormir. Mas, sim, é disparadamente um dos melhores e mais ousados filmes do diretor alemão Wolfgang Petersen. Um cineasta que possui uma variada filmografia que envolve filmes de guerra, ação, épico, drama e aventuras em alto mar. A História Sem Fim é o seu primeiro grande filme de fantasia do catálogo. Mais tarde, dirigiria Tróia (a adaptação de 2004 da lenda grega Aquiles), logo após filmes como Força Aérea Um (o "Duro de Matar" presidencial estrelado por Harrison Ford em 1997) e Na Linha de Fogo (clássico suspense de 93 estrelado pelo rei dos filmes policiais e dramas de faroeste, Clint Eastwood, e co-estrelado pelos brilhantes John Malkovich e Rene Russo; elenco icônico de hiper estrelas).
Outro marco na história é que seu orçamento (U$$ 60 Milhões) tornou o longa o filme mais caro já feito fora dos E.U.A. até aquele momento. Arrecadando expressivos U$$ 100 milhões, o filme se pagou e demonstrou interesse à Warner (que, até aqui, era uma distribuidora do filme) em continuar a história.
Curiosamente, Alan Oppenheimer, a voz do Come-Pedra, o dragão Falkor e do lobo G'mork (as principais criaturas da história) é também o narrador. Ficou também conhecido por ser a voz original do Esqueleto (He-Man), a animação quarentista Super-Mouse e o seriado clássico O Homem de Seis Milhões de Dólares (1974-1978).
A História Sem Fim (1984) foi também o primeiro grande sucesso da Constantin Film, dos produtores Bernd Eichinger e Bernd Schafers. Criada em 1979, a produtora foi responsável por diversos títulos de sucesso e alguns vencedores do Oscar: O Nome da Rosa, A Casa dos Espíritos, O Sexto Sentido, Dança com Lobos e muitos outros.
A HISTÓRIA PRECISA CONTINUAR
Embora não estivesse cogitado que A História Sem Fim fosse divido em uma cinessérie de filmes para contar a história toda - a exemplo de O Senhor dos Anéis - em 1990, veio a sequência mas de uma forma independente: com outro diretor e um novo intérprete.
Dessa vez, a Time Warner (uma divisão interna da própria Warner Bros.) entrou na produção com um investimento menor. Na direção, sai Petersen e entra o desconhecido George Trumbull Miller, cineasta escocês que também é produtor. O nome confunde com o icônico diretor e criador de Mad Max.
A História Sem Fim II vem com 5 minutos a menos em relação ao filme original (cerca de 89 minutos, na média dos longas animados da época). Intitulado nos E.U.A. como: The Neverending History II: The Next Chapter (A História Sem Fim II: O Próximo Capítulo se fosse oficialmente traduzido com o subtítulo), adapta a segunda parte do livro com bastante liberdade criativa.
Outra grande surpresa é a presença de John Wesley Shipp como o pai de Bastian (Jonathan Brandis). Em 1990, Wesley Sipp marcava a televisão como The Flash, o icônico seriado que trazia para a telinha a nova era da febre dos super-heróis DC desde a Batmania de Tim Burton: mais sombria e mais humana.
A trilha sonora de Robert Folk é delicadamente sensível e nos faz entrar literalmente na magia da trama - a começar pela longa introdução com letreiros se apresentando pelo espaço (algo um pouco parecido com a cinessérie Superman de 79) enquanto a visão viaja por estrelas em leve velocidade. Também trouxe uma nova canção de Giorgio Moroder: Dreams We Dreams. Aparentemente, Michael Ende pediu para que seu nome não fosse creditado no filme de 1984 - tendo uma introdução sem citá-lo (porém, é possível ver nos créditos finais). Neste segundo capítulo, é possível ver o nome de Michael logo no início.
A Imperatriz menina, na tradução da dublagem brasileira (que, por sinal, tem um elenco memorável e uma das melhores já produzidas), é aqui interpretada por Alexandra Johnes. A versão brasileira tem direção de Newton de Matta com gravação na De La Riva. Curiosamente, a dublagem de Jonathan Brandis é feita pela Marisa Leal (A Pequena Sereia, Família Dinossauros, Maria do Bairro) e Atreyu por Danton Mello (irmão de Selton Mello). Houve também uma segunda dublagem para a tv paga, SBT e HBO MAX com direção de Newton de Matta e dublagem de Peterson Adriano (Bastian) para os estúdios Hebert Richers.
A relação entre pai (Brandis) e filho (Shipp) é o ponto mais alto e mais marcante do filme. Eu me recordo muito bem do exato momento em que me peguei de surpresa ao chegar na sala (o nosso Estúdio Sala), avistar sobre a estande uma pilha de outros títulos, e, do lado, o meu pai gravando a fita VHS recém alugada para a nossa coleção particular. Era meados de 1993. Fiquei surpreso que havia uma continuação de A História Sem Fim e a cena estava exatamente em algum momento em que Bastian e seu pai se reencontram (logo após a cena da cachoeira). Dá uma emoção só de lembrar.
Era um período em que recontratar um novo elenco para continuações era comum. Embora, a trilogia A História Sem Fim seja lida como uma cinessérie um pouco distinta uma da outra justamente pelo tom de cada longa e por procurar retratar os anos de vida do personagem através de gerações distintas. Portanto, isso acaba sendo compreensível - a exemplo de algumas outras cinesséries como 007 e Jack Ryan. Embora, no caso de James Bond, isso teria sido incidental até se tornar uma transformação comum com visões e formas diferentes do personagem ao longo dos anos.
Brandis é brilhante e segue como um ótimo Bastian e tão bom quanto o original. Infelizmente, o talentoso astro mirim veio a nos deixar em 2003.
Como confirmado pelo próprio Wesley Shipp, Brands também chegou a aparecer no episódio 7 ("Child's Play") do seriado The Flash (1990-1991) no papel do personagem Terry Cohan. Com 48 minutos de duração, o episódio foi ao ar em 15 de Novembro de 1990 - 1 mês após o lançamento de A História Sem Fim II.
O passado do protagonista e a relação familiar é um ponto alto do filme. Aqui, a mãe de Bastian (Helena Michell) é revelada pela primeira vez em lembranças.
Como de costume nesta cinessérie, há um antagonista e um grande vilão - como vemos em Star Wars: um aprendiz e um mestre oculto na saga contra o lado negro da força (embora o livro que deu origem a toda A História Sem Fim tenha vindo bem antes). Numa nova forma de recontar as ameaças do original em favor de uma nova aventura, o "Nada" é substituído pelo "Vazio" e o existencialismo volta em questão. Em A História Sem Fim, a verdadeira ameaça não tem rosto ou forma. A ameaça antagônica que encobre o grande vilão dessa vez, sai o lobo e é personificado em Xayide, uma vilã de figurinos excêntricos na pele de Clarissa Burt - que conquista com sua imponência esbanjando charme e inteligente crueldade em meio a distribuição de olhares penetrantes, expressões pausadas e hipnotizantes - a atriz supermodelo seduz mais do que assusta. E é justamente por isso que a atuação de Burt torna Xayide uma verdadeira bruxa dos contos de fadas das mais perversas. Disparadamente uma das melhores escalações do elenco ao lado de Brandis e Wesley Shipp. Xayide, da mesma forma que G'mork, é apenas servente ao grande vilão que desencadeia toda a história ou uma serva de qualquer um que tenha um grande poder, como sempre, por troca de interesses.
Em um estimativo custo de produção avaliado em mais de U$$ 36 milhões (aproximadamente U$$ 23 milhões a menos do que o primeiro ), A História Sem Fim II teve uma arrecadação de U$$ 17, 5 milhões contra os U$$ 100 milhões do filme original (aproximadamente, 6 vezes menos). Teve sucesso maior na Alemanha (terra de origem) arrecadando mais de U$$ 3 milhões a mais.
REVIVENDO FANTASIA COM MIXAGEM ANOS 90
Fantasia e Rock'n Roll. É como podemos resumir A História Sem Fim III, se compararmos ao sensível filme de 84 ou o familiar segundo capítulo de 90. O terceiro capítulo procura desenvolver uma história original, ignorando os eventos do livro e procurando trazer alguns elementos inspirados no filme de 84 - como uma celebração ou uma revisita noventista do conto cinematográfico que fez história como o primeiro filme mais lucrativo fora de Hollywood.
Tudo o que realmente parece é o de ser uma verdadeira festa - assim como costumam ser o terceiro filme de toda cinessérie: uma celebração ao filme original (ou, em partes, uma memória dele). A verdade é que este terceiro capítulo procura quebrar esse elo padrão com os anteriores.
Nos E.U.A. o filme foi intitulado The Never Ending Story III: Escape from Fantasia - A História Sem Fim III: Escapando de Fantasia, numa tradução completa - embora o subtítulo americano não faça muito sentido com a trama. O slogan por aqui aparece com os dizeres: " A Aventura Continua", o que faria mais sentido. Numa tradução completa mais próxima ao do cartaz brasileiro: A História Sem Fim III: A Aventura Continua. É um modelo de slogan que soa nostálgico só de ler por estar presente em todas as divulgações de uma sequência durante aquela década.
No álbum da trilha sonora do filme, há ainda o slogan: "Here Comes the Fantasians" - algo como: "Aqui Vem os Fantasianos" - um trocadilho com "Marciano" ? Para dizer que eles não são do nosso mundo ? Fica a curiosidade.
A VERGONHA DE JACK BLACK
Em seu primeiro papel no cinema, Jack Black é a grande surpresa do elenco. Na época, ninguém jamais imaginaria que ele seria o mesmo que explodiu no cinema de comédia dos anos 2000. Aqui, ele faz um raríssimo papel de vilão do filme. E é justamente por isso, ao assumir o tom bad boy, algo tão pesado e diferente em comparação à toda a sua cinebiografia. Da mesma forma que é mal, ele é extremamente divertido - valendo comparar aos Cobra Kai de Karatê Kid: o antagonista que persegue o herói (hoje, podemos dizer: bullying).
Quando ainda não era uma grande estrela do cinema, Jack era um grande fã do filme original e aceitou participar deste terceiro capítulo. Infelizmente, houveram notícias pelos corredores de que o ator teria se recusado a falar sobre o filme em diversas entrevistas ao longo dos anos devido a má recepção. Por não ter ficado satisfeito com o resultado, acabou ficando envergonhado de comentar.
UM TOM MAIS FRENÉTICO
Karin Howard, roteirista do segundo, retorna neste escrevendo uma história muito mais dinâmica e muito mais agitada e divertida. Assistindo anos e anos depois, o longa se torna uma verdadeira comédia divertida com um toque de emoção familiar. E tão bom quanto em sua época, o filme envelheceu bem e continua sendo o melhor filme da trilogia: espanta a tristeza e nos traz uma bela celebração non-stop com pegadas de geração MTV.
William Hootkins e Mac McDonald, respectivamente, heranças de Batman (Tim Burton, 1989)
estão entre as vozes das criaturas fantásticas do filme.
Peter McDonald (Rambo III) assume a direção conversando bem com o bom ritmo do roteiro numa intensa aventura de fantasia e humor. Demonstrando aqui a sua vasta experiência com o ritmo frenético dos filmes de ação da década de 80 e 90. Um de seus primeiros trabalhos notáveis foi o de co-diretor em Batman (1989). Temos pelo menos dois papeis vindo do grande sucesso de Tim Burton: William Hootkins e Mac McDonald. Hootkins assumia o papel do oficial corrupto, Eckhardt, e McDonald, Terence, chefe dos capangas do Coringa. Hootkins é a voz da Árvore da Sorte e Falkor (o mais famoso interprete, desde o lendário Alan Oppenheimer) e McDonald encarna uma personagem feminina na trama (a hilária mulher do sr. Come-Pedra ou Mrs. Rockchewer na cópia legendada). Posteriormente, o mesmo diretor teria dirigido também Van Damme em Desafio Mortal (1996).
Se o segundo se parecia um pouco com o primeiro filme, este toma um rumo completamente único. Embora, os mais conservadores prefiram o tom sério do primeiro (que continua incrível) este explora muito melhor os personagens coadjuvantes e o próprio Bastian, agora assumindo toda a ação da história (sem a presença do guerreiro Atreyu), dividindo espaço com uma nova personagem: Nicole.
Kevin McNulty e Tracey Ellis são os pais de Bastian da vez, assumindo os nomes Barney e Jane Bux respectivamente. Desta vez, o passado familiar do protagonista não é explorado justamente por ser quase uma nova origem que pouco se conecta com os filmes anteriores - apenas sabemos que ele "está de volta à Fantasia" mas a forma como a história é contada em suas sequências é quase como se ele estivesse conhecendo o livro pela primeira vez e aqui não é diferente. Embora isso tenha uma justificativa: apresentar uma nova abordagem a novas audiências.
O papel de Bastian agora fica à mercê de Jason James Richter, o astro do sucesso Free Willy e o colírio mirim daquela temporada. Nicole é assumida por Melody Kay (Férias em Alto Astral). A ótima química da dupla traz muita doçura em tela e uma certa rivalidade entre os dois (levemente construída) reservam apaixonantes momentos de diversão intensa.
Melody (graciosa) tem até momentos de canto no filme . Nesse momento, a produção expressa descrições e detalhes visuais que ambos os irmãos estão partidos: Nicole teme um novo divórcio da mãe e Bastian tem apenas o pai (a mãe não é mencionada nesse capítulo). Diante dessas faltas, esta nova família precisa ganhar força se unindo.
Segundo Howard, haviam ideias de que Nicole (Melody) fosse realmente a antagonista da história. Bastian passaria o maior tempo em Fantasia e a sua meia irmã o atrapalharia na trajetória, porém, o ajudando em alguns momentos. Esse papel acabou ficando para os "Sórdidos" liderados por Slip (Jack Black).
E agora, quem é o vilão mais cruel de toda a trilogia ? Com toda a confusão gerada, e o tom de comédia, o papel de Slip é mais suavizado aqui mas o tom pesado pode ser sentido com relação às decisões catastróficas que ele toma na história: causando o caos e prejudicando as relações familiares de todos. Isso é ou não é a decisão mais humana de um vilão numa trama ?
Julie Cox: classuda |
A cinessérie A História Sem Fim teve seu relativo sucesso mas não tão expressivo a ponto de, provavelmente, manter uma grande parcela de fãs exigentes com o mesmo elenco: além de ser uma audiência infantil acompanhando, existe também a ideia de que Bastian tem suas fases da vida - da infância à juventude. E apesar de algumas semelhanças de um filme pro outro, é sentido o tom diferente em cada capítulo - e esse aqui é radicalmente diferente: melhorando tudo para uma era pós-globalizada. É sentido também que as criaturas mágicas já agregavam costumes da sociedade moderna do nosso mundo.
Dessa vez, o filme volta a ter duração longa, com 1 minuto a mais em relação ao filme original (95 minutos) mas o ritmo é extremamente recompensador e o tempo não é sentido.
E o que embala todo esse ritmo ainda melhor é a trilha sonora. Sempre um capricho nos anteriores, mas aqui eles não deixaram a peteca cair, tanto na canção instrumental de abertura brilhantemente revisitada por Peter Wolf quanto na trilha sonora cantada composta por vários artistas e remixes maravilhosos e raros no repertório sonoro. Uma delas falam muito da mensagem da cinessérie que é o "-Estou em missão do amor. Salvando os sonhos da nova geração..", Mission of Love de Nemorin e ganha o nosso PUNHO DOURADO de Melhor Canção. Toda a trilha substitui muito bem a sensação de emoção que foi Limahl em 84 em seus 10 anos de memórias e aqui se torna um show intenso de música eletrônica, hip-hop, reggae e um certo pop/ rock de primeira. Algumas canções, citando o título do filme ou não, fala-se muito de transição para a nova geração: era o ano de 94, era pós-globalização, tecnologia em alta com o Windows, computadores, realidade virtual e um mundo de Fantasia e livros no meio de tudo isso. É a História Sem Fim que veio consertar tudo.
A História Sem Fim III teve um orçamento aproximadamente semelhante ao anterior: U$$ 17 milhões (alguns milhares de dólares a menos), sendo o mais barato da trilogia. Teve uma arrecadação de apenas U$$ 5 milhões, encerrando a saga nos cinemas.
E este é o seu Punho Dourado de
Melhor Canção: Mission of Love (Nemorin)
O EPÍLOGO DA TRILOGIA REDESCOBERTA
TRANSFORMAÇÕES QUE FAZEM TODO O SENTIDO
Existe uma discussão acalorada sobre A História Sem Fim III que a gente só acaba sabendo mesmo pela internet. É aonde conhecemos o quão profundo e problemático são as tribos e comunidades de fãs de uma marca, série de filmes, bandas de música e etc (ou insira qualquer-grupo-base-com-seres-humanos-no-comando por aqui). Tudo isso por serem extremamente conservadores de uma forma absurdamente exagerada. Tudo bem que o terceiro capítulo se desprendeu dos anteriores e faz referências à cultura pop chegando a ser quase uma paródia. É um estilo de modelo controverso, que pode desagradar alguns, mas funciona muito bem aqui pois melhora e atualiza alguns personagens sem descaracterizá-los - como é o exemplo da família Come-Pedra: o que dizer do impagável " Born to Be Wild - The Stoneman " ? Ou quando o próprio Come-Pedra faz referência à famosa banda: "- Eu vou trabalhar para os Rolling Stones" enquanto o filho está assistindo desenho animado numa parede projetora (já previram as televisões de parede: visionários). Além do casal de anões - Engywook (Tony Robinson) e Urgl (Moya Brady) - que já eram briguentos e aqui estão mais neuróticos do que nunca: praticamente caricaturando aqueles casais que adoram umas d.r. (a tradicional discussão de relacionamento) feito velhos.
Talvez o arco dos irmãos (Bastian e Nicole) seja o mais equilibrado aqui por envolver um drama sobre compreensão em se acostumar com as aproximações de uma nova família em formação (e não sofrer com avaliações repentinas - ainda que contra as suas vontades), e alguma impertinência sobre breves comunicações que destoam seus mundos, há a invasão de privacidade (é daí que surgem as boas tiradas).
Essas inserções de humor parecem não fazer sentido para quem não se interessa em filosofia ou em existencialismo mas é o preço quando aquele mundo mágico e puro intensifica seus conhecimentos se misturando com a loucura que é o nosso mundo real: um misto de paródias e dramas. Até a própria Imperatriz questiona seus poderes em comparação ao poder aquisitivo sobre consumir roupas - quando ela é enaltecida ao ser lembrada de seus valores por um de seus assistentes. A paródia funciona quando ela faz sentido para a narrativa, como é o caso aqui - e é o caso de filmes recentes no campo de super-heróis, como Thor Ragnarok, que só melhorou toda a trajetória do Deus do Trovão dos cinemas lá na Marvel Studios.
A influencia já existe também em nossa sociedade desde o início dos tempos: é o que moldou e formou novas culturas ou até etnias (seja através de exploração ou de uma imigração de costumes). Portanto, é o que transformou e atualizou a história da cinessérie até aqui.
Não existe um único gênero na vida de ninguém, na verdade. Por isso temos três filmes com climas muito distintos um do outro - é a democracia cinematográfica: mesmo eu não me agradando tanto com algum título de determinada cinessérie, eu nunca torço para a inexistência deste pois é preciso que a visão seja democrática e a importância das adaptações de A História Sem Fim mostraram isso.
Você também gosta de sonhar ?