Batman, originalmente intitulado: "The Batman" trouxe um novo e grandioso nascimento. O que muitos pediram, está lá: o foco investigativo.
Com orçamento em torno de U$$ 100 milhões, Batman se compara ao mesmo custo de Batman Eternamente, trazendo uma reformulação inédita de um vilão já conhecido (O Charada, coincidentemente, um personagem também presente no filme de 95).
Christopher Nolan, que já havia se consagrado por ótimos filmes policiais com excelentes construções de narrativa, fez o seu nome nas adaptações de quadrinhos ao transferir essa visão para um dos personagens mais populares da cultura pop ao abrir um novo leque de possibilidades a filmes de origem sobre personagens icônicos do cinema, em sua visão, ao contar com um enredo profundamente detalhado e levar a cinebiografia de Batman a um mundo bem realista: meio acinzentada em seu começo de carreira (Batman Begins) e que depois foi ganhando mais cores (O Cavaleiro das Trevas). Nesta versão 2022 do diretor Matt Reeves, há muito o que ser comparado ao legado deixado por Nolan: o teor de violência é tão impactante quanto contando com um diferencial: há algum sangue.
Dentre outras comparações entre Reeves e Nolan, há uma certa inspiração sentida em Blade Runner (algo também adotado em Batman Begins) mas existem diferenças: a ambientação na versão de Reeves valoriza o tom mais escuro de uma forma viva (criando um verdadeiro tom de suspense) e a forma incrível como o personagem (Batman) consegue interagir nesse ambiente de uma forma que leva o espectador a mergulhar de uma forma nunca antes vista. Vale lembrar também que o jogo de cores traz um tom mais amigável ou familiar na visão de um ambiente de verdade - por vezes extremamente sujo ou por vezes extremamente luxuoso ou bem animado como o agito de uma grande metrópole. Outro elemento são as falas de pensamento que costumam ser muito comparada às obras de detetives (e é também um elemento encontrado na primeira versão de Blade Runner). Há mais algumas outras referências ao célebre longa adaptado de Ridley Scott quanto Nolan se inspirou em Begins: como até mesmo os guarda chuvas transparentes. Isso sem contar as referências a outros do gênero policial psicológico que ajudam a compor a história.
Da mesma forma que Michael Keaton nos anos 80 (marcado por filmes de comédia), Robert Pattinson era um nome improvável mas que veio arrancando elogios da crítica após uma certa adaptação adolescente na primeira década. Aos mais atentos, esse passado se define como completamente apagado agora. Mesmo nas divulgações, seja pelas imagens ou pelos trailers de grande sucesso na rede, já se mostrava que a viralização silenciou os provocadores e o resultado nesse longa de quase 3 horas (175 minutos, o maior filme já feito na cinebiografia do personagem) trouxe uma ótima definição de Batman como personalidade. A tensão e as expressões por Robert Pattinson são brilhantemente testemunhadas - mantendo-se completamente um Batman e um Bruce Wayne que pouco se diferem: nesse ponto, é também possível comparar a coincidência com Michael Keaton (possuía um certo tom de sadismo mas era um Batman que surgia quando necessário). Tal caracterização, é teoricamente adotada pela audiência com uma justificativa plausível no desenvolvimento da história. O Batman de Pattinson está sempre presente: ora como o morcego, ora como Bruce (se consagrando com todas as caracterizações de "maior detetive do mundo" como assim foi descrito em suas origens dos anos 40, antes de adotar o subtítulo "O Cavaleiro das Trevas" na fase de Frank Miller).
Ainda que seja negado por alguns, as características detetivescas já estavam presentes nos filmes anteriores - especialmente na faceta de Keaton, as suas expressões de movimentação lenta e olhares bruscos são realmente testemunhados. Pattinson tem mais tempo de tela para explorar isso tudo e além em seu Batman (com ou sem traje) - e há ainda um valor emocional profundo e uma certa tensão em momentos específicos (em que o público também acompanha junto).
Andy Serkis traz inéditas qualidades ao seu Alfred Pennyworth, em uma relação não tão próxima com Bruce Wayne (Pattionson) mas que ao mesmo tempo traz surpresas arrebatadoras nesse envolvimento.
Paul Dano é o Edward Nashton, O Charada, mais surpreendente que o cinema já viu até então. Com uma construção de personagem completa em toda a sua caracterização e expressões que não deixa o público sentir falta e até mesmo associar semelhanças que se encaixam de forma fiel ao seu visual misterioso.
Batman é o personagem necessário que precisamos e coincide na expectativa de imenso sucesso da temporada - justamente num momento de crise (e estranhas consequências que nos fazem estar diante de mais uma guerra) - o que coincide também com suas origens: o super-herói surgiu em 1939, 10 anos após a Crise de 29 ou A Grande Depressão dos EUA, em seguimento com a Recessão de 37, que causou a queda dos bancos e empobrecimento de grandes empresários e famílias inteiras. Essa forte presença dos super-heróis do cinema, é um momento que pode tornar essa herança forte da cultura internacional um símbolo cinzento de esperança ou uma forma da audiência se identificar mais - a busca de superação após a queda ("-Por que caímos ?" essa foi uma frase muito popular em Batman Begins de 2005). Batman sempre foi visto como o oposto do Super-Homem (enquanto o azulão buscava salvar as crianças da visão cruel da guerra em suas aventuras, Batman vinha como um oposto menos otimista e mais humanizado do mocinho).
Apesar de haver uma comemoração acerca de uma maior exploração de seu lado detetivesco, houveram certas reclamações quanto a manter Batman de armadura. Há uma mistura entre gerações neste longa de 22 mas é coerente o uso da armadura quanto aos perigos apresentados num mundo que busca ser realista, embora a fantasia com habilidades específicas funcione muito melhor num mundo de fantasia dos quadrinhos. Para cada ambiente existe um pé de realidade que combine melhor.
Zoë Kravitz traz sutileza para a sua Selina Kylie. Apesar da caracterização mais realista da máscara não ser marcante (tirando a simpática orelhinha), o destaque fica mesmo com as suas mudanças na vestimenta, seguindo as tendências de adaptação de super-heróis para o cinema do século XXI (menos fantasias e mais atores destacando seus rostos). Porém, toda a atuação de Kravitz compense satisfatoriamente.
Olhando a produção como uma história em quadrinhos (como aqueles almanaques grossos e pesados), Batman difere das origens do Ano Um, referências levemente apresentas no filme de 2005, e nos apresenta o Ano Dois do personagem.
Para os cinéfilos mais veteranos, Colin Farrell (Oswald Cobblepot/ Pinguim) chega a lembrar muito Robert de Niro como Al Capone em Os Intocáveis (1988). Ainda que visualmente, já que seu papel é extremamente diferenciado: com um sotaque italiano e personalidade própria.
Michael Giacchino (Missão: Impossível - Protocolo Fantasma, Rogue One), à frente da excelente trilha sonora, compõe o suspense e soa muito melhor e mais simbólica do que se imaginava - se comparando ao que foi apresentado nas divulgações de forma muito poderosa mas, aqui, o trabalho em tela é muito melhor e nada que foi apresentado anteriormente entrega o que se pode esperar.
Todo o elenco é muito bem escalado e bem alinhado. O diretor (Reeves) foi preciso com a obsessiva busca pela perfeição e diferenciação como um filme único. Embora pensado como trilogia, o diretor diz não pensar em uma sequência no momento (essa é a grande charada). A mitologia do personagem tem leques muito amplos, percebe-se que esse grandioso reinício deve parecer muito difícil de ser superado a fim de não ser comparado com este, ainda mais num mundo realista aonde as possibilidades podem ser ainda limitadas se comparadas ao mundo de infinitas possibilidades de ficção e fantasia dos quadrinhos. Seu gênero e estilo de universo permitem bastante exploração de diversos elementos, mas como trazer vilões que poderiam ser muito estranhos sem fugir da coerência do universo Reeves (ou Reevesverso agora) ? Uma dessas questões é personagens que poderiam soar interessantes mas que parecem ser bem difíceis de adaptar nesse mundo realista composto por Matt Reeves: como o Sr. Frio (um interessante desafio futuro para o morcego mas que parece soar mais um filme de charadas).
A origem do herói aqui, também envolve referências às suas próprias origens externas somada a um grande e impactante mistério nunca antes explorado.
Há um pouco de Burton e há um pouco de Nolan por aqui. O conceito de 'criatura esquisita' algo que vimos pela primeira vez lá em 89 e a inserção de um mundo próximo do nosso (coisa de 2005).
Todo o seguimento para o grande final, não faz o espectador se cansar e sempre esperar por mais. Embora o peso de toda essa complexidade ceda com uma leve queda de ritmo no grande climax, é imersivo em sua perfeição de profundidade e merece ser visto mais de uma vez.
Versão Legendada: apenas uma linha de diálogo se mostra confuso na tradução mas se destaca no impressionante trabalho técnico em traduzir objetos dentro do próprio filme: embora não seja novidade, essa prática de tradução ficou marcada por filmes em 3D, Disney e Pixar, pioneiros durante os anos 2010 por esse detalhe.
Memórias da Sessão
Sala cheia. A reação da plateia foi fria mas extremamente atenta. Houve o incômodo de celulares ligados ao fundo - coloquei a mão para terem noção e cheguei a colocar a minha mochilona na frente (para incomodar mesmo). Pra completar, um jovem cidadão (cabelos grandes e talvez na faixa dos seus 20 anos) me coloca o seu pé cruzado apontado para a minha cadeira (mas que rapidamente se descruzou, então, estava tudo certo).
A audiência respeitou o fim dos créditos mas o Cinesystem (como de costume em todo cinema de shopping) não e, o pior, ligou todas as luzes com os créditos passando na tela. Desta vez, eu tive que registrar.
Ah, apesar da reação quieta da tela, houve uma breve risada ao fundo e uma tentativa de aplauso que, infelizmente, não foi acompanhada pela plateia (só a minha que comecei timidamente lá ao fundo).
Outra decepção da Cinesystem é que eles dizem oferecer o balde com a máscara do Batman - mas é preciso pagar R$ 40,00 pelo combo para levar. Senti falta de brindes como o Fan Event da UCI (aonde estão os posters e lembrancinhas ?).
SESSÃO CRÍTICA