A DC ESTÁ REAGINDO
Se tem um exemplo de filme protagonizado por mulheres independentes em um filme de ação, eu poderia me recordar agora de Thelma & Louise. Um longa metragem que, pela primeira vez, identifico como simbolo desse estilo, lá de 1991 - complicada e liberal década de 90 aonde muita coisa hoje seria motivo de escândalo e discussão política e social na web.
Aves de Rapina é radicalmente diferente daquela infame série de TV Birds of Prey do canal Warner. Enquanto que na série, o trio seguia a formação original dos quadrinhos, no filme, a protagonista é Arlequina (Margot Robbie) substituindo Batgirl.
Sensação do Universo Cinematográfico DC, finalmente Margot Robbie ganha um longa metragem só dela - como Arlequina. Aqui, Robbie é também produtora da obra e já se destaca como um dos maiores talentos do cinema americano da atualidade.
Arlequina, criação de Bruce Timm, ganhou reconhecimento nos quadrinhos e no cinema
A personagem, Arlequina, surgiu originalmente na série animada Batman: Volume 2 (Batman: The Animated Series) exibida aqui pelo SBT (1993) e Warner Channel. Um feito raro entre as adaptações de quadrinho (e até das próprias obras de origem) tendo uma protagonista saída de uma adaptação e gerando querida repercussão.
A história de Arlequina é complexa. Apesar de ser admirada por muitos pelo seu visual (bem sexualizada em versões posteriores) há uma justificativa profunda e significativa. Acontece que a personagem é fruto de um mero instrumento do vilão e arqui-inimigo do Homem-Morcego: Coringa. É submetida a um relacionamento abusivo o qual não consegue se desvincular. Esse antro de loucura em sua mente é o que a torna a ser que conhecemos: desregulada e sem muita consciência de suas ações (comprometida por reações químicas de um acidente, assim como Coringa originalmente).
Diante das transformações que já testemunhamos em produções anteriores (adaptações da concorrente MARVEL) como Homem de Ferro e Wolverine, a Arlequina de Margot é claramente mais humanizada na história - uma estratégia conhecida para atrair melhor a simpatia dos espectadores. Isso foi até funcional para a obra, levando em consideração que a personagem não perdeu suas características problemáticas de destaque que a fazem uma anti-heroína como diferencial - é a típica doidinha, que, embora tenha ganhado mais consciência e atitude de seus atos, também se envolve em situações figuradas ou certas fugas da realidade (fora as encrencas que se envolve no caminho).
Só por contar com uma história simples e objetiva, Aves de Rapina faz esquecer Esquadrão Suicida como a grande presença de Margot Robbie no papel de Arlequina em uma aventura de equipe. Sim, um caso de relacionamento passageiro, sem necessidade de uma discussão, quando então temos um vilão certeiro, na medida certa para o desafio de sua personagem e das demais integrante deste time (que, pelo menos no filme, o título não tem nenhuma justificativa ou desculpa pra ter origem).
Na condução de enredo, a história tenta transpor para a realidade a força feminina das heroínas em cena, sem explorar muito de suas limitações físicas - embora, o mais natural esteja na suas caracterizações visuais tão comuns e diversificadas que cativam o público.
As cenas de luta, visualmente influenciada pelos quadrinhos, soam quase perfeitas na transição para a realidade de seu mundo cinza - embora o exagero da camera lenta possa incomodar um pouco para justificar reações tão precisas da (então) heroína Arlequina. Tirando isso, o jogo de cores vale destacar como parte de um belo trabalho técnico da direção de arte - tanto no visual que caracteriza este universo Arlequinesco quanto nas cenas de ação - uma verdadeira parte de sua cartunização assim como o jogo de gato e rato e a busca pelo tesouro como coração da história.
Enquanto Arlequina transpõe entretenimento e sua inocência testada à prova, os arcos de Caçadora (Mary Elizabeth Winstead) e Canário (Jurnee Smollet-Bell) são bem envolventes, tendo também Cassandra Cain (Ella Jay Basco) e Renee (Rosie Perez) como elementos que completam essa experiência paralela de uma jornada mais pessoal.
Ewan McGregor é a surpresa masculina desse elenco feminino fabuloso, de novos rostos, como Roman Sionis - um antagonista charmoso, envolvente e que, ao comprar sua empatia, a vende como medo assim que assume o seu lado cruelmente descontrolado pela sede de ambição e extrema intolerância. Praticamente, um vilão que se mostra ameaçador justamente pelo seu certeiro controle de domínio sobre suas oponentes. Nesse lado do time, Chris Messina alimenta e reforça, apesar da característica força bruta, como um sagaz Victor Zsasz, agora, não um mero capanga, mas divertido e presente e até com mais importância do que nos filmes da trilogia O Cavaleiro das Trevas.
Outro elemento interessante no filme é a sua relação em se espelhar com os cultuados filmes independentes da década de criação de seus quadrinhos noventistas - só a presença do veterano McGregor (tido como revelação em Trainspotting: Sem Limites de 95) já pode deixar uma pista, ainda que não intencional, e a forma como a história é contada - nem sempre de forma cronológica - fora os elementos de cartunização do enredo aonde tudo acaba sendo contado do ponto de vista de Arlequina.
Não só o filme em sua base como também a trilha sonora é envolvida nesse clima alternativo e divertido dos filmes policiais do gênero.
Ao lado de Mulher-Maravilha, Aves de Rapina é um dos melhores filmes de ação da DC e já define o potencial das personagens femininas dessa geração na tela.
ATENÇÃO: Fiquem até depois dos créditos
Memórias da Sessão
Painel do filme semanas antes da estréia
SESSÃO CRÍTICA
Sessão Acompanhada: UCI PARKSHOPPING 21:00 - 06/02/ 2020 (estréia)
Bibliografia: Cineclick/ Flix Cannel