CUSTOU LUTAR, NÃO CUSTOU SONHAR
Akira foi um longa animado de 1988 que conquistou (e chocou) público e crítica - assim que saiu nos cinemas brasileiros em 1992.
Com a graça do VHS, fiquei para absorver um tempo a animação (e até compreender que o Akira não era exatamente aquele protagonista de arma na capa). Com apenas 8 anos de idade eu assisti uma animação maravilhosa mas não entendi nada. Só depois, bem depois. Hoje, é um dos meus favoritos de todos os tempos e só tenho a agradecer aquela tarde maravilhosa de maratona de desenhos alugados do ano de 92.
Em Fevereiro de 1995, Akira é anunciado para SNES em uma lista curiosa de jogos da CES 1994 publicada pela revista Ação Games nº 76. Porém, sem data definida.
Num relato paralelo:
O curioso é que GoldenEye (adaptação do filme homônimo 007 contra GoldenEye) também aparece nessa mesma lista. A produção que seria da EON (a mesma produtora do filme? Ou uma inédita EON Software ?), foi abandonada e uma nova adaptação foi pensada que se tornou o sucesso do tal "Project 64" lá em 97. E perdemos mais um bom jogo de plataforma no SNES (possivelmente, o melhor jogo do 007 dos 16 Bits, com folga).
Se pesquisar, a lista não para. Tem muito mais títulos extremamente curiosos na lista da CES 1994 da Ação Games e o que estava ansiosamente aguardado por mim no Mega, foi sem dúvida The Mask (também da THQ). Eu havia acabado de assistir ao filme com a família toda no cinema e estava extasiado e encantado. Precisava jogar aquilo no videogame de qualquer jeito (a melhor forma de me lembrar dos grandes filmes que eu havia acabado de assistir no).
Voltando alguns meses antes (provavelmente Outubro de 94) a revista Sega Mania veio na frente e apresentou não só uma descrição do jogo Akira como também uma foto e a data de lançamento para a versão de Sega CD. Segue a descrição da revista Sega Mania Nº1 (com suas próprias letras e formas em toda a descrição):
Você assistiu o desenho animado ? Então já sabe o que te espera: muita ação futurística na Tóquio do futuro, com Kaneda enfrentando gangues de motoqueiros, telepatas paranormais e mutantes assassinos. O que? Você não assistiu o desenho "Akira" ? Corre para a videolocadora, meu. Lançamento EUA: dezembro (Sega CD)
E desde então, daquele ano de 1994, aguardei uma versão para Sega CD e, quem sabe a esperança de ter um, com o jogo Akira, no Natal de 1995. Fiquei imaginando o precinho (meus pais pagaram R$ 75,00 no cartucho do Jurassic Park: Rampage Edition de Mega no Natal de 94). Eu tinha alguma esperança que, se saísse para Sega CD, em algum momento podiam lançar para o Mega. Embora, a aparência era tão sofisticada que não dava pra acreditar que sairia um jogo assim pro Mega Drive (embora a cor amarela da nave parece estranha na foto, parecendo uma galinha Knorr). Lembro de sair contando pra todos os colegas do colégio do jogo, mas quase ninguém do meu círculo era habituado com anime naquele ano de 94-95 a não ser Os Cavaleiros do Zodíaco. A coisa só foi melhorando quando peguei a turma de 97 pra frente - aonde um grupo bem seleto curtia realmente videogames e animes.
Devo ter ficado por um bom tempo acreditando que o jogo de Akira havia saído em algum momento pro Sega CD ou eu havia esquecido de vez ou lamentado sua falta. Mas a grande surpresa surgiu ao descobrir o vídeo da CES 1994, liberado no You Tube há algum tempo. Eu jamais imaginaria que um jogo assim poderia rodar no Mega Drive, sem o Sega CD (e ainda acreditava que era o Sega CD).
Akira foi o jogo mais ambicioso de Mega Drive que eu poderia ter conhecido. E só pude ter real certeza disso graças aos parceiros do Unseen64. Logo, eu pude saber de que o Mega Drive seria mais capaz do que já foi. A internet é maravilhosa por causa dessas coisas (embora possa ser muito terrível também a ponto de destruir tudo de bom que você acreditava).
E agora, Natal de 2019 (olha aí a coincidência com o enredo do filme) liberam o beta do jogo Akira para o incrível site de banco de dados Hidden Palace. Pra fechar bem a década de 2010, a segunda do século XXI, e 26 anos desde o anuncio de seu possível lançamento que nunca aconteceu.
O jogo sairia em multiplataforma (além do Mega, Sega CD, Game Gear, Game Boy e Super Nintendo), no melhor estilo The Incredible Hulk (1994). Vendo pelo conceito dele, seria um jogo bastante ambicioso - variando 4 estilos diferentes de ambiente: plataforma, corrida, primeira pessoa e visão isométrica.
A cortesia é de Matsuda e de um doador anônimo (seria algum envolvido na produção?).
Sabe-se agora que, muitas das versões em multiplataforma (Sega CD, Game Gear, Game Boy e Super Nintendo), seriam discutidas para o futuro e - além delas - versões de PC e Atari Jaguar estavam incluídas nas possibilidades em questão.
Tudo começou no ano de 1993, quando Lawrence Siegel - CEO da Black Pearl Software - recebeu um VHS de presente do amigo Steve Harris, fundador da icônica revista Eletronic Gaming Monthly (1988-atual). Ao assistir a obra, Siegel percebeu que havia um grande potencial naquela história, pronta para ser transformada em um fenômeno de vendas nas multiplataformas. Partiu então para o Japão a fim de obter os direitos de Kodansha Comics (a editora que originalmente publicou o mangá Akira o qual o anime foi inspirado) e conheceu Katsuhiro Otomo (o autor e diretor do longa) que o presenteou com 50 artes de divulgação e lhe desejou boa sorte. Sim, ele iria precisar.
A produção começou no mesmo período em que Larry concordou em fechar uma fusão com a THQ. A ideia era trazer mais artistas e mais apoio financeiro para a criação do jogo, porém, a esperada solução na expectativa desse casamento virou um pesadelo na realidade.
A versão de Super Nintendo chegou a avançar por algumas semanas mas acabou não indo pra frente com o delicado estado financeiro da Handmade Software, britânica softhouse contratada pela THQ.
O CEO da Handmade, Jim Gregory, estava insatisfeito por não encontrar uma visão definitiva para o jogo de SNES. Mas a equipe esteve disposta, chegando a criar várias visões diferentes do mesmo game - um deles em estilo Shadowrun (o clássico RPG de visão isométrica).
Uma versão para o Super Game Boy pode ser observada num vídeo de 2016 pelo historiador Patrick Scott Patterson que vendeu as quatro cópias por U$$ 2.729, 00 em um leilão no eBay (após 37 propostas, segundo Kara Dennison do Crunchyroll). Por motivos são desconhecidos, o jogo teve o desenvolvimento transferido da Handmade Soft. para a ICE Software em um determinado momento.
Infelizmente, com os problemas de desentendimento na produção (entre a THQ e a Black Pearl) e a crise financeira da empresa envolvida (Handmade) o projeto não foi pra frente. Quase tudo, pelo que se sabe, foi destruído, arquivado ou desaparecido (quem estava envolvido, ficou sem o acesso pelos direitos).
O game não tem nenhuma fase completa e a última fase trava. Mas vale muito o achado e como vale.
Foi bem interessante que a popularidade do anime se expandiu no ocidente durante os anos 80, com o lançamento do VHS, e coincidiu com a geração 16 Bits e a febre dos Cavaleiros do Zodíaco aqui nas terras tupiniquins. É incrível como essa experiência de Akira envolveu toda uma indústria de videogames ou uma parte da história dela.
Akira de Mega Drive (ou parte dele) foi o fruto de um trabalho árduo protagonizado por uma família de amigos, de profissionais apaixonados que empenhava um projeto e se viu em um inesperado iceberg, um verdadeiro bloqueio que chega a ser um ato de arrogância por parte dos engravatados da THQ, segundo o que pudemos testemunhar. Sempre que Larry tentava a atenção nas reuniões e as voltava para o projeto Akira, o mesmo era jogado para outros projetos menores. Um dia, Larry Siegel se cansou e se demitiu da THQ farto do tratamento que ele e sua equipe estavam sofrendo - tiveram ideias geniais mas estavam sendo completamente menosprezados todo o tempo.
Acredito o quanto foi impressionante o esforço de Larry e sua equipe para manter esse projeto. Talvez, esse projeto poderia ter salvo a THQ e transformado essas empresas para algo incrível com as ideias grandiosas de Larry e a pequena Black Pearl, mas quem sabe? Jamais saberemos agora.
Felizmente, há uma esperança por parte de uma geração de apaixonados que seguem fervorosamente o legado de Larry, com o poder da influencia digital na manga - a internet nos deu algo em que podemos acreditar. Agora, é torcer para que um entusiasta de verdade pegue esse jogo pra finalizar o que sobrou. Ao menos os gráficos, trilha sonora e coisas acessadas pelo arquivo fonte estão lá. Nem tudo está perdido. Jogo tem até animações entre corte de cena - não habitual no Mega. No sistema, animações assim, costumam ter mais em joguinhos de nave (que são games mais simples e ocupam menos memória).
Nunca duvidei do potencial do Meguinha, o dia que eu duvidei eu me arrependi.
Agradecimentos Especiais & Conteúdo de Apoio
Hidden Palace
Crunchyroll