OVERTURE

terça-feira, 15 de julho de 2014

[Sessão Comemorativa: Dia do Homem] Destrinchando: True Lies (Dir. James Cameron, 1994) - 20ª Aniversário

NESTA POSTAGEM



PRELÚDIO  
JAMES CAMERON: DA FICÇÃO Á COMÉDIA


SESSÃO CRÍTICA 
TRUE LIES


EXTRAS  
MEMÓRIAS DA SESSÃO
GALERIA
Elenco
Bastidores
Cenas
O Elenco de 'La Totale!'
TRUE LIES NOS VIDEOGAMES
VÍDEOS
TRUE LIES 2?

ENTREVISTAS
James Cameron
Arnold Schwarzenegger



---PRELÚDIO--- 
JAMES CAMERON: DA FICÇÃO À COMÉDIA

Jim Cameron, em início de carreira, era como um daqueles assistentes obcecados por trabalho a ponto de invadir a porta de um quarto de escritório numa madrugada só para terminar o que começou até ser interrompido pelo produtor chefe, que só planeja e decide realizar tudo para finalizar no tempo certo (temendo um desfalque no orçamento).

Após 3 décadas dirigindo filmes de ficção, o diretor canadense decidiu arriscar em uma categoria inédita - sem deixar de lado o gênero ação (sua marca registrada). "-  O ideal é se manter imprevisível" assim dizia o gênio. Tal afirmação é fruto daquele que seria o seu próximo filme depois de O Exterminador do Futuro 2: O Julgamento Final. "- As pessoas só o conhecem pelo que você já fez." pondera Cameron, após revelar que a sua terceira parceria com Arnold Schwarzenegger seria.. engraçada. True Lies (ou traduzindo seria: "A Verdade da Mentira") é a sua adaptação de comédia Francesa de 1991 intitulada  "La Totale!" com base no roteiro escrito por Didier Kaminka, Simon Michaël e Claude Zidi (diretora do original). 

Nos bastidores, o clima pareceria parodiar aquela imagem de 'patrão James Cameron' pelo senso de humor da turma. "Você não me mete medo - Eu trabalho para James Cameron" e "O Exterminador do Futuro 3 - Estou Fora" são algumas das frases que a sua equipe costumava estampar em suas camisas. Mas o recado do exigente diretor era coerente com o que podemos testemunhar em sua biografia: "- Sou durão, mas sou justo!"


---SESSÃO CRÍTICA---
TRUE LIES

SMOKING E TESTOSTERONA

Após os eventos de 11/9, todos os filmes de ação seguintes pareciam ganhar um sabor amargo em Hollywood. Começamos a viver num período onde o mocinho encarava a paranoia e resolvia o quebra-cabeça como num drama psicológico. 

Talvez o auge mais feliz dos filmes de ação pipoca parecia ter se despedido para sempre. Talvez o cinema americano jamais faria um filme de ação com intenções de também fazer o público rir. Os inimigos acabavam então sendo as instituições corruptas ou os servidores que ali integravam. Após surgirem os longas de Super-Heróis da Marvel Studios, aos poucos, o cinema começou a ganhar ares épicos de nostalgia desse estilo esquecido graças a longas como Os Mercenários 2.  

"A Verdade da Mentira" em True Lies, é que ele se trata de um filme de ação autêntico - para quem realmente gosta do gênero. Com apenas um único filme de ação em uma década, James Cameron realiza o mais inspirador trabalho do estilo "ação-pipoca-com-festival-de-explosões-romances-e-comédias" de uma geração regada a "Rambo" e ignora "James Bond".  

O grandalhão de sotaque austríaco atendido por Arnold Schwarzenegger realiza aqui o seu melhor papel. Consegue ser durão, engraçado e romântico como "Tasker", "Harry Tasker". Harry prova ser tão bom quanto o velho Bond, sem utilizar as engenhocas e não ser tão caricato - auxilado também pela abordagem de sua rotina realista. Ele está entre duas famílias: o trabalho e o casamento.  

Tom Arnold (impagável) sabe muito bem como conduzir um personagem de comédia sem parecer piegas e mostra isso como Albert Gibson. O fiel colega de Harry acaba obrigado a auxiliar o amigo até nas piores (e 'extras') missões conjugais. Jamie Lee Curtis é Helen Tasker, mulher de Harry Tasker, uma secretária dona de casa que esconde por trás de uma reservada esposa uma sede por aventura e uma mulher fatal. Na pele de Juno Skinner, Tia Carrere sensualiza como uma incrível rival de Helen.

Bill Paxton também se destaca como Simon, o 'amante' fanfarrão de Helen. O tremendo aspirante a malandro divide a vida entre o papel de pseudo agente secreto e um vendedor de carros 'cafona', com suas vestimentas anos 70 ao som de "More Than Woman" dos Bee Gees. 

A bela Eliza Dushku é Dana, filha dos Tasker, uma adolescente rebelde que 'foge' ao som de 'Living Colour' e é comparada a uma geração tomada por Axl Rose e Madonna - a brilhante comparação de Gibson registra muito bem essa época de 'Beavis & Butt-Head' avaliando clipes na MTV. Dushku é mais uma graciosa adição ao elenco - se torna uma das grandes heroínas nos momentos finais.

Sabendo da "ideia de grandeza" a cada novo trabalho do diretor James Cameron, é esperado sempre um longa ainda maior tanto estruturalmente quanto em história. Diferente de "La Totale!", a adaptação de James Cameron traz ao protagonista um surpreendente e numeroso arsenal: vítimas fatais chegam a 100 contra os 10 da obra Francesa, isso sem contar os helicópteros, jatos Harrier, metralhadoras e (pasme!) um cavalo enquanto o agente francês chega a detonar seus vilões com sacos de farinha.

Entre a sinopse da mega adaptação e a obra original: Harry 'se disfarça' como um vendedor de computadores ao revelar o seu cotidiano 'ganha-pão'a sua esposa; na obra original, o agente diz a sua esposa Helèn, uma bibliotecária sedenta por uma vida mais emocionante, que é um funcionário da telefonia. 

Como o maior mocinho da história, Harry vive os vestígios de uma era marcada pela Guerra do Golfo e a era Bush. É um soldado que realiza a sua tarefa diária - socando terroristas - e volta pra casa no fim de sua missão. Um herói vulnerável onde qualquer pai de uma família tradicional poderia se identificar - aquele que cumpre suas tarefas profissionais e retorna para casa e é abraçado pelo filho como um herói enquanto vive aquela rotina com a esposa. 

O temível terrorista Salim Abu Aziz vivido por Art Malik é o maior vilão do filme e tem tudo o que um verdadeiro terrorista da Al Quaeda poderia ter. A diferença é que naquele tempo se podia brincar com o terrorismo com as mais diversas formas, desde o elegante Hans Gruber (Alan Hckman) de Duro de Matar ao megalomaníaco vilão que vemos em Aziz. Na década de 90, o terrorista ameaçava os E.U.A. (como o caso do caminhão de bombas na entrada do falecido World Trade Center) e parava por aí. 

Um ato de efeitos catastróficos como vemos no 11/9 ainda era impossível de acontecer, fazia apenas parte de uma enlouquecida ficção. Aziz é tão caricato que dá pra se comparar a um 'supervilão' - e às vezes se torna vítima de situações engraçadas. Impossível levar a sério como uma crítica ao povo árabe - o vilão pode ser qualquer e ele está espelhando ao inimigo de qualquer nação.  

Cameron soube muito bem aproveitar as personagens femininas como personagens fortes em suas obras anteriores. E em True Lies, essa fator se multiplica, com direito até a uma vilã e um confronto entre mulheres. Por pouco, Harry não se torna um alvo da infidelidade se não fosse por um determinado corte (esta suposta cena deletada podia ser vista no trailer de lançamento). Se não fosse por tudo isso, este longa certamente só agradaria aos homens.

Jamie Lee Curtis (Helen) arrasa em cena de dança; 
fotografia traz substância.

E o que dizer sobre a trilha sonora?  O compositor Brad Fiedel é um dos nomes a também marcar sua terceira parceria com James Cameron desde os dois primeiros "O Exterminador do Futuro". Fiedel traz uma magnitude sem tamanho ao adaptar batida e violino para uma autêntica trilha de aventura (alguns ainda se lembrarão do Exterminador só de associar o compositor).

'Sunshine Of Your Love' (Living Color) é a canção tema que adiciona um rock enérgico à trilha - a exemplo dos Guns n' Roses em 'O Exterminador 2'.  No momento mais erótico, 'Alone in the Dark', do cantor Jonh Hiatt, tempera definitivamente o show de strip-tease (embasbacante e cheia de personalidade) da personagem encarnada por Jamie Lee Curtis. 

Em meio a tanta música empolgante no repertório, há espaço também para as mais sensíveis. Shirley Walker compõe em parceria com Brad um tango numa das cenas mais icônicas e orgânicas do filme. A adaptação deste tema é idêntica ao do espanhol Por Una Cabella  ("Por uma Cabeça de Cavalo" na tradução) composta originalmente por Carlos Gardel e letra de Alfredo La Pera. 

A fotografia azulada em ambientes noturnos se tornaram uma marca registrada em "O Exterminador do Futuro 2". Aqui ela é embalada de forma luxuosa, um exemplo disso é a sequência da dança sensual (cheia de personalidade) de Helen.  Retratando a era computadorizada pela qual o mundo estava prestes a colidir, a tecnologia é como um personagem coadjuvante do filme - os efeitos visuais (indicado ao Oscar) continuam excelentes e convencem até hoje.

James Cameron gosta mesmo de impressionar com a sua versatilidade. Só de testemunhar os diálogos incríveis e impagáveis somada a momentos pastelões puros com direito a mentiradas convincentes - onde personagens se livram de uma situação por sorte ou caem em uma enrascada por azar -dignas daquele roteirista genial que veio a se tornar uma grande revelação nos anos 80.

É nas tomadas grandiosas e detalhadas em câmera lenta (como se viu na cena do caminhão em "O Exterminador do Futuro 2") que James Cameron mostra a expansão artística de sua fama como o melhor diretor de filmes de ação. Em True Lies, a sequência ousada e com mania de grandeza vem na sequência onde Tasker foge de um míssil lançado pelo terrorista Aziz - o rastro de destruição é vista em detalhes. Só por essa tomada, Cameron já mostra para que veio e por quê True Lies é um dos melhores e mais inspiradores trabalhos do gênero.

Bombardeado injustamente pela crítica, True Lies era acusado por alguns como "xenofóbico" e "sexista". Tais acusações podem se considerar apenas impressões se observado além. Parece difícil encontrar uma aventura onde se misture amor, risadas, som de qualidade, excelentes atuações e explosões dentro uma história recheada de incoerências bem equilibradas.

Além de entretenimento fino para um grande público, True Lies é uma aula de como se fazer refilmagem em meio a tantos títulos desnecessários dessa linhagem. Durante sua produção, foi considerado um dos filmes mais caros já realizados. Um tremendo épico de ação. Os acréscimos desta adaptação certamente se tornaram exemplares para outros agentes do cinema mexerem os seus pauzinhos.


Momento Pós-Crítica
A suposta cena deletada em True Lies (vista no trailer) deixaria Harry Tasker numa fria se estivesse entrado na versão final do filme. Um herói "Marido infiel" nem pensar. Talvez uma preocupação justa para um filme Hollywoodiano de grande orçamento que é fruto de um cinema pregado pela moral e os bons costumes do politicamente correto. 
O veterano Charlton Heston (Ben Hur) faz uma surpreendente aparição como Spencer Trilby, o chefe da agência secreta "Omega Force: The Last Force Line" (Força Ômega: A Última Linha de Defesa) - um título digno de uma história de Super-Herói e que faz jus aos perigos enfrentados por Harry Tasker e sua equipe. Os fãs de quadrinhos poderão comparar Spencer ao personagem Nick Fury dos quadrinhos da Marvel.
Jean-Claude Parachini (a voz de "Don Juan") interpreta um personagem creditado com as iniciais de seu próprio nome.


---EXTRAS---
 Memórias da Sessão
Na versão em DVD, houve algumas diferenças de tradução na legenda em comparação ao VHS pouco ousadas e mais formais. "Tontão!" virou "Colhudo", "É Fogo na Roupa!" virou "Você Está Fora!". E coisas desse tipo. A faixa etária também mudou (de 14 para 12 anos) mesmo com cenas tórridas de strip tease e alguma truculência.


Pela performance cômica de Jamie Lee Curtis, meu pai virou fã de carteirinha da atriz (ele destaca, principalmente, a cena do helicóptero). Foi nessa mesma época que alugamos um outro título estrelado por ela: 'Uma Família Quase Perfeita' de 1996.

GALERIA
 Elenco
Arnold Schwarzenegger

Jamie Lee Curtis

Tia Carrere

Art Malik


Bill Paxton

Tom Arnold

Grant A. Heslov


Charlton Heston

HARRY E SEUS PARCEIROS 
DE TRANSPORTE
Cavalo Policial


Helicóptero 


Jato Harrier

Bastidores

James Cameron (Diretor) no "Making Of True Lies".


Cameron, Arnold e Jamie nos set.


Arnold e Paxton gravando.

O diretor em ação.

Capa da revista Empire sugere o retorno de Arnold da Morte ("Arnie! Back from the dead with True Lies ?") em referência aos fracassos de 'Junior' e 'O Último Grande Herói' (1993)."-True Lies conquistou o público, garimpando U$$ 27,5 Milhões só em seu primeiro final de semana no último final de semana nos E.U.A." (Revista SET, Setembro de 1994)

Cenas

Harry enviando informações pelo computador.

Harry encara terroristas em um banheiro público*
(*Nota: a música ouvida nessa cena não está presente na trilha sonora).

Harry encontra e faz 'amizade' com o seu 'antagonista': 'Carlos: O Chacal' ou o melhor...Simon.

Teste de fidelidade: Simon tenta fisgar Helen e uma situação 'inusitada' acontece.

Skinner rende Helen e a faz de refém.

Helen (ao fundo) chora antes de receber a missão "Boris & Doris" dos agentes.

Aziz exibe a sua poderosa arma de destruição; Skinner observa ao fundo.

Harry: "-O Que eu posso dizer? Sou um espião."

Harry e Gibson: cenas impagáveis.

Tal pai, tal filha.

Concorrência pura entre beldades.

Gibson e Faisil (Heslov): parceria cômica.

"-A bateria acabou, Aziz!" momento infeliz para o câmera Jihad (Mike Akrawi)


Samir (Charles Cragin):  "- Tem algo que gostaria de dizer antes de começarmos?"
Harry Tasker: "- Sim! Eu irei matá-lo em breve." 

Tango

CARTAZES




O Elenco de 'La Totale!'
A versão original que deu Origem a True Lies

Thierry Lhermitte é o agente François Voisin (o protagonista)

Miou-Miou é  Hélène Voisin (esposa de François)


Eddy Mitchell é Albert Grelleau (o amigo fiel de François)


Sagamore Stévenin é Julien Voisin


Michel Boujenah é Simon/ Marcel 


Para quem assistiu a versão de James Cameron, reconhecerá essa cena entre François e Albert. 


 Simon e Hélène.

Card com galeria de cenas diversas.

VÍDEOS
"Living Color - Sunshine of Your Love" videoclipe do filme.


Making Of


Erros de Continuidade


Trailer de 'La Totale!'



TRUE LIES NOS VIDEOGAMES
O jogo do filme saiu para Mega Drive, Game Gear e Super Nintendo fabricado pela Beam Software e publicado pela Acclaim (a mesma das conversões de Mortal Kombat). Ao fim dos créditos do longa, é possível observar uma propaganda divulgando a adaptação. 

TRUE LIES 2 ?
Coincidindo com o esperado lançamento do primeiro Homem-Aranha estrelado por Tobey Maguire, o jornal O Dia chegou a anunciar notícias sobre futuros lançamentos com pretensões de serem grande sucesso no cinema, um deles era True Lies 2. A nota publicava uma previsão para 2002.

Abaixo segue um histórico de notícias publicadas pelo site Cinema em Cena, em 2003, revelando o segmento de True Lies 2 até o seu engavetamento por James Cameron:
Em tempos que o terrorismo está tão vivo quanto Hitler na mente dos Americanos, True Lies 2 se tornou uma continuação inviável de ser filmada naquele roteiro. Infelizmente. 

Tom Arnold e Jamie Lee Curtis permaneceram interessados em realizar a continuação após as  notícias de cancelamento devido os atentados de 11 de Setembro, mas com a candidatura de Schwarzenegger como governador da Califórnia, eles tiveram que esperar. James Cameron atualmente está envolvido nas sequências de Avatar. Uma possível sequência de True Lies nunca mais foi comentada.  

ENTREVISTAS
[Disponibilizado em 19/7/14]
Textos Originais: Revista SET - Setembro de 1994
Adaptações: Mestre Ryu

JAMES CAMERON
"SOU DURÃO MAS SOU JUSTO"
Arnold Schwarzenegger teve dificuldades em convencê-lo a realizar True Lies?
Arnold achou que uma versão de La Totale! seria uma possibilidade interessante. Eu tinha cá meus projetos que queria sugerir a ele, e estava sendo só educado (risos), ouvindo primeiro as sugestões dele, meio que com uma atitude de "está bem, fale aí desse seu projeto amalucado e depois eu conto a você quais são as minhas boas sugestões". Ele deu três sugestões, mas eram todos projetos que já estavam sendo desenvolvidos em outros estúdios. Expliquei a ele que, por estar iniciando a minha própria produtora (a Lightstorm), eu precisava de um projeto "limpo", que não viesse a nossas mãos já com o envolvimento de terceiros, foi que ele mencionou La Totale!. Assistimos ao filme, rimos bastante e, o mais importante, a piada fundamental do filme parecia maravilhosa: a de Arnold essencialmente corneado, a ideia de que o cara mais machão do mundo teria esse calcanhar de Aquiles, que é seu amor por uma esposa tímida. Ele topa qualquer parada, mas pira quando defrontado com esse que é o problema mais universal de todos.

Que elementos você identificou em La Totale! que poderiam justificar um remake ameriano? E que problemas você enfrentou na criação de um novo script? 
O maior desafio era fazer com que Arnold pudesse ser um marido menosprezado pela esposa. E esse desafio também era dele: parecer um chato em casa. Claro que ele jamais pareceria um bobalhão no sentido clássico, mas conheço homens tão concentrados em seu trabalho por excluir tudo mais de suas vidas. E, pra mim, o desafio foi escrever um script engraçado, porque eu nunca havia feito isso antes. Havia momentos cômicos em meus outros roteiros, mas o humor nunca havia sido um dos objetivos de um projeto meu.

Outra escolha importante é Jamie Lee Curtis no papel da esposa. Por que ela? 
Eu vinha querendo trabalhar com Jamie desde O Abismo. Já nos conhecíamos socialmente, porque ela já trabalhou num filme da minha então esposa Kathryn Bigelow (Jogo Perverso), mas queria também conhecê-la, como atriz dramática e cômica. Escrevi o roteiro com ela em mente, mas quando terminei passei por aquele período de dúvida - não só dúvida, mas desejo de explorar outras possibilidades, o que e normal - e testei outras atrizes. Mas voltava sempre a preferir Jamie. 

É impossível deixar de levar em consideração que este é o primeiro filme de Arnold depois de O Último Grande Herói. Você, já trabalho com ele duas vezes antes de True Lies, notou alguma diferença em Arnold?
Nenhuma. Arnold nunca é inseguro. Essa é uma das qualidades dele. Se alguma vez ele sente insegurança, nunca demonstra. O problema é que O Último Grande Herói pedia aos fãs que mostrasse amor incondicional por Arnold. Mas um filme precisa ser bom; ninguém está acima disso. 

Outro ponto que também se discute muito toda vez que você e Arnold trabalham juntos é o orçamento. Comenta-se que True Lies teria custado U$$ 120 milhões, o que o torna o filme mais caro de todos os tempos. Custou tanto assim?
Este filme custa U$$ 7,50 (risos), mais o estacionamento (esse é o preço de um ingresso de cinema em Los Angeles). Falando sério, todo filme que Arnold e eu fizermos sairá mais caro, porque trabalhamos de forma grandiosa. Mas acho um filme não deve ser julgado pelo custo. Nosso problema em True Lies não foi fazer o filme ficar mais barato, mas conciliar os elementos de uma grande produção com os momentos pequenos e caseiros do filme, que são mais engraçados e frágeis. Não me aborreço com esse tipo de curiosidade - entendo o quanto essa argumentação pode render em termos de notícia -, mas não acho justo passar uma entrevista falando de gastos. Deveria mandar o contador falar no meu lugar (risos). 

Você tem fama de ser um diretor ultraexigente, que dá duro em suas equipes. Você é tão durão assim? 
Sou durão, mas sou justo. Não é como querem me pintar. Trabalho duro - e exijo o máximo de mim mesmo e da equipe. Não dou duro no meu elenco, por achar que o trabalho deles é o mais difícil de todos. O papel de diretor, nesse caso, é o contrário: é facilitar o trabalho do elenco, dar aos atores apoio, sugestões e a possibilidade de fazer mais tomadas, nunca sendo psicologicamente adversário. Na equipe eu dou duro, que é o necessário quando se está gastando dinheiro todo dia. É uma máquina enorme, que precisa ser regida como se aquilo fosse uma operação militar. É o que faço, não vejo nada de incorreto nisso. 

ARNOLD SCHWARZENEGGER
O HERÓI VULNERÁVEL 
Foi você quem sugeriu a Jim Cameron realizar um remake de La Totale!, depois de ter visto o filme original a conselho de seu cunhado, Robert Shriver. O que havia em LaTotale! que o interessou a ponto de você querer dar uma nova versão à história.
Foi a combinação de vários elementos: a ideia de fazer um thriller de espionagem meio à la James Bond e, ao mesmo tempo, esse tipo de personagem que é incapaz de lidar com seu dia-a-dia, com as atividades mais corriqueiras de qualquer pessoa normal. Quer dizer, é um jogo de opostos: um cara que encara todos os terroristas do mundo, que apaga todos os incêndios, por assim dizer, mas é incapaz de resolver sua vida particular. Isso me pareceu muito engraçado. 

Você e Cameron respeitaram quase integralmente a história original. 
Mostrei o filme a Cameron, ele gostou, pegou a ideia básica do original e escreveu o seu próprio script; o filme francês foi feito numa escala muito menor e, nos Estados Unidos, para ser competitivo, para criar interesse por esse tipo de filme - ainda mais depois de os filmes de James Bond terem estabelecido um nível de qualidade altíssimo -, você precisa realizar algo verdadeiramente espetacular.

Há quem considere True Lies uma mudança de rumo pra você, por tratar-se de um personagem sofisticado, culto, que usa smoking e dança tango. 
Esse era outro atrativo pra mim, fazer esse cara que anda de terno, fala dez línguas diferentes e se adapta a qualquer situação. Cameron queria elaborar o personagem de maneira que ele tivesse um certo grau de elegância mas que ainda assim o público me visse fazendo coisas que já me viu fazer antes. É gostoso interpretar um personagem que é heroico mas também deixa clara a sua vulnerabilidade.

True Lies é seu primeiro filme depois de o Último Grande Herói, tido por muitos como seu primeiro grande fracasso. Você sentiu uma pressão adicional para superar aquele mau momento? 
Não, pelo contrário. A pressão maior que eu poderia ter sentido foi para superar o sucesso de O Exterminador do Futuro 2. De certa forma, você sabe que vai chegar um momento na sua carreira em que o pêndulo oscila para o outro lado; esse momento sempre chega. Lembro de uma conversa com o diretor Jerry Zucker,em que ele me disse que depois de Ghost ficou paralisado, incapaz de fazer um só filme por três anos seguidos. Só agora ele está filmando de novo, em Londres. ele me dizia que não sabia o que ia fazer, que as pessoas esperavam que ele fizesse a mesma coisa, mas que aquilo era impossível, porque Ghost já estava feito e ponto final.
Agora entendo também quilo por que passa um ator quando ganha um Oscar. Todo mundo olha pra você de maneira diferente. É o que me disse Emma Thompson (com quem ele está trabalhando na comédia romântica Junior). Todo mundo fica na expectativa: "Será que ele consegue de novo?"

Então pode-se dizer que tudo aquilo foi um alívio, porque significa que o pior já havia passado?
Não acho que ninguém havia se sentido aliviado logo após o lançamento de O Último Grande Herói (risos). Mas você precisa aturar, porque isso faz parte do negócio. É como naquele velho ditado: se você não aguenta o calor, então saia da cozinha.

Segundo James Cameron, o ponto fraco de O Último Grande Herói foi esperar que o público dedicasse a você um amor incondicional, independente do que você fizesse. Você concorda com ele?
Não acho que seja uma questão relativa ao papel em si, mas ao conceito do filme. Se você cria um conceito sofisticado demais para um público que você está visando - no caso, o público jovem -, e quem entende o filme é o público mais adulto, você cria um problema. E foi o que percebemos ao longo de várias exibições-teste: a garotada não entendia muito bem por que em determinados momentos eu estava dentro da tela e, em outros, fora dela. Não compreendia o conceito e, portanto, não compreendia a história.

Nem sempre as coisas funcionam como você imagina. E se o filme não deu certo, não deu. Não há o que negar, não há desculpa. Todo mundo deu o melhor de si, realizando e divulgando o filme, mas o conceito não deu certo. A imprensa, então, detectou essa fraqueza e começou a nos atacar, até que tudo virou uma montanha-russa incontrolável.

Isso afetou sua carreira de alguma forma? Você mudou a maneira como escolhe os filmes e os papéis que vará daqui por diante?
O que é preciso entender é que dentro desta comunidade, dentro de Hollywood, não houve, em momento algum, a ideia de que eu teria "fracassado". Passei a ter mais ofertas ainda, desde então. E esses dois filmes que acabei de fazer, True Lies e Junior (dirigido por Ivan Reitman) foram tratados bem antes de eu começar as filmagens de O Último Grande Herói.  

FICHA TÉCNICA
Título Original: Idem
Data de Lançamento: 2 de Setembro de 1994 (Brasil)
Sessão Acompanhada: DVD - 22:30 - 13/04/2014 (Sábado)
Gênero: Ação
Direção: James Cameron
Duração: 140 Minutos
País: E.U.A.